Atentado mata 52 pessoas em Londres

Há 10 anos… dia 7 de julho de 2005.

Atentado mata 52 pessoas em Londres

POR TIAGO MALI*

Meu celular, um tijolinho quadrado horrível, nunca tocava. Sua função era ligar num esquema de baixo custo para o Brasil, não receber chamadas. Mas ele insistiu em berrar durante todo o dia. Queriam saber se eu estava vivo, o jornal X ou Y estava pedindo para eu escrever alguma coisa, diziam que tinha de ligar aos parentes avisando que passava bem. Para todos que falaram comigo naquele dia, fui um anticlímax dos atentados de Londres em 7 de julho de 2005. Eu deveria, mas não estava lá.

Insatisfeito com a vida, deixei o curso e o emprego que me mantinham na capital inglesa e, uma semana antes, rumei para o Norte. Despedi-me do Ricardo, que dava adeus à árida Manchester, procurei cursos de Pós por ali e aproveitei a viagem para ir às manifestações contra a reunião da cúpula do G8 em Gleeneagles. Pegaria o ônibus de volta no dia do atentado, de manhã, mas adiei a passagem para fazer um último samba. “Puxa, perdeu por pouco!” ou “que porra de jornalista que foge da notícia”, exclamavam.

Eu olhava atordoado para a TV. Caos, sangue, explosões. Nada conseguiria ser pior, quando soube, na cobertura ao vivo, da explosão do ônibus de dois andares na Tavistock Square. Havia se passado uma hora das primeiras bombas do metrô. As estações estavam fechadas, mas agora outra explosão acontecia do lado de fora. A espinha gelou. Perguntava-me, e acredito que todos por ali o faziam, se aquele show de horrores continuaria indefinidamente.

Estava atordoado, mas não surpreso. Depois do 11 de setembro e dos atentados de 11 de março em Madri, todos os que moravam em Londres sabiam ser os candidatos preferenciais a próximo alvo. Nas rodas de conversa não era uma questão de “se”, mas uma questão de “quando” ou de “quão efetivo” seria o ataque. Infelizmente, foi muito. Quando os quatro jovens detonaram os explosivos que traziam junto aos seus corpos, mandaram pelos ares três vagões de metrô e um ônibus, fizeram 56 mortos (incluindo os homens-bomba) e mais de 700 feridos. A data não repetia o dia 11, mas fazia sentido: os líderes dos países mais poderosos do mundo estavam ao lado discutindo medidas anti-terrorismo, e Londres, no dia anterior, fora eleita para sediar as Olimpíada.

A lógica daqueles ataques perpetuou-se. Dos quatro homens-bomba, três eram britânicos, filhos de imigrantes paquistaneses; apenas um estrangeiro. Quando se pensa no quanto as medidas de segurança e vigilância se intensificaram sem que a discussão sobre a inclusão dessas minorias na sociedade avançasse na Europa, fica mais fácil entender o que leva hoje centenas de europeus a engrossar as fileiras do Estado Islâmico.

Antes de pegar o ônibus de volta para Londres, na manhã do dia 8, comprei uma pilha de jornais. O que mais me impressionou, no entanto, era um gratuito, o Metro News, se não me engano. Trazia a capa preta, com as fotos dos mortos identificados estampadas num mosaico. Foi a primeira vez que vi um recurso visual desses, que acabaria virando chavão, numa capa de dia seguinte. Os rostos e as histórias daqueles mortos e dos homens bombas molharam meu rosto nas cinco horas seguintes de viagem.

Poderia dizer que o clima quando cheguei era de medo, apreensão, paranoia, perplexidade. Estaria usando clichês para mentir. Tudo era calmo e triste. Os dias que se seguiram estamparam um semblante de alívio nos rostos pouco afeitos a sorrisos dos ingleses. O que esperávamos finalmente aconteceu, eles tiveram a sua vingança, e agora a vida seguiria. Essa parecia ser a frase que embalava os corações dos londoners, embora ninguém a ousasse externar.

Mas a paranoia e o medo permanente iriam se instalar, sim, duas semanas depois. Parece exagero, mas as quatro tentativas frustradas de ataques que ocorreram novamente no metrô de Londres, em 21 de julho, pareceram marcar muito mais profundamente o estado de espírito dos ingleses – e certamente o meu – que os atentados de 7 de julho. Não, o perigo não tinha passado. Não, a vida não seguiria do mesmo jeito. Desta vez, eu estava dentro de uma das estações no momento em que ela foi evacuada e voltei para casa assustado numa caminhada longa e surreal.

Mas essa história fica pra outro dia… Porque todo dia é histórico.

* Tiago Mali é coordenador de cursos da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) e fundador do capítulo brasileiro da agência de jornalismo de dados J++. Foi editor na Revista Época, editor e redator-chefe na Revista Galileu e editou e foi repórter dos sites da ONU e do PNUD no Brasil, entre outras publicações.

Momentos após o atentado:

Documentário sobre 7/7:

+MAIS:

– Acervo Estadão

– g1.globo.com

– noticias.uol.com.br

– Wikipedia

– bbc.com

– theguardian.com

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