Há 45 anos… dia 20 de julho de 1969.
POR ALEXANDRE AGABITI FERNANDEZ*
O dia 20 de julho de 1969 foi data de duas façanhas que assombraram a humanidade. A primeira delas foi a chegada do homem à Lua, uma das maiores conquistas do gênero humano. Transmitida ao vivo pela TV, coisa rara na época, a conquista da lua fascinou os terráqueos. A segunda proeza aconteceu sobre a crosta terrestre, mas nem por isso passou despercebida: a vitória do belga Eddy Merckx, de 24 anos, em sua estreia no Tour de France.
Foi a primeira das cinco vitórias de Merckx na mais tradicional prova do ciclismo mundial (venceria também em 1970, 1971, 1972 e 1974) e chamou a atenção pela forma como o ciclista belga a conquistou: com um brio extraordinário, esmagando os adversários.
Merckx não era um desconhecido dos fãs de ciclismo, como poderia ser – para a maior parte da população mundial – Neil Armstrong, o astronauta que deu os primeiros passos sobre a Lua: tinha no currículo vitórias no Giro d’Itália (1968); no Campeonato Mundial (1967); na Milão-São Remo, a clássica das clássicas (1966, 1967 e 1969); na Paris-Roubaix (1968); na Paris-Nice (1969) e em dezenas de outras provas de prestígio.
No Tour de 1969, o belga conquistou a camisa amarela – de líder na classificação geral – depois de vencer a sexta etapa, conservando-a até o final. Merckx venceu sete etapas naquele Tour, com destaque para a 17ª, com 214,5 km de extensão, disputada sob um sol abrasador entre Luchon e Mourenx, nos Pireneus. Pouco antes do fim da subida do Col du Tourmalet (2115 m de altitude), Merckx atacou e passou pelo topo na liderança. Faltavam 135 km para a chegada, mas o belga continuou acelerando. Subiu o Col de l’Aubisque (1709 m de altitude) sozinho e cruzou a linha de chegada com 7min56s de vantagem sobre o perseguidor mais próximo, o italiano Michele Dancelli. Seus rivais foram meros figurantes.
O jornalista Marcel Clare, do jornal l’Équipe, que acompanhou de perto a gesta do campeão belga naquela tarde de 15 de julho, escreveu: “guardaremos por muito tempo a lembrança dessa jornada fastuosa, em que um homem elevou-se para além de si mesmo”.
Raymond Poulidor, terceiro colocado naquele Tour, disse: “Merckx atacou sem realmente atacar no Tourmalet, para marcar pontos na classificação de melhor escalador. Ele se isolou, abriu cem metros de vantagem, depois mais cem. Como ninguém se aproximava, ele continuou. Ninguém acreditava que aquilo pudesse dar certo. Nem ele. Atrás, pedalávamos, sem mais. Todo mundo estava acabado por causa do calor. Estávamos praticamente parados, o asfalto derretia.”
Era o começo da legenda de Eddy Merckx no Tour de France, que não demorou a receber a alcunha de “Canibal”. Indicava a fome de vitórias, que o levava a “comer” os adversários.
Além de ganhar o Tour de 1969 com enormes 17min54s de vantagem sobre o segundo colocado, o francês Roger Pingeon, Merckx conquistou as classificações de melhor sprinter, melhor escalador e levou ainda o prêmio de combatividade – feitos que ciclista algum conseguiu repetir.
Ao vencer o Tour com tamanha superioridade, Merckx foi chamado de extraterrestre. Neil Armstrong também recebeu o mesmo qualificativo por parte daqueles incrédulos empedernidos, que não acreditavam que o homem pudesse chegar à Lua.
* Alexandre Agabiti Fernandez é jornalista, tradutor e apaixonado por ciclismo há mais de quatro décadas.
Vídeo da 17ª etapa do Tour de France, a assombrosa vitória de Merckx:
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