Há 20 anos… dia 28 de março de 1994.
POR FELIPE FIGUEIREDO MELLO*
Fazer música nunca foi a intenção única do Pink Floyd.
O quinteto londrino formado por Syd Barrett (guitarra e vocal), Roger Waters (baixo e vocal), David Gilmour (guitarra e vocal), Nick Mason (bateria) e Richard Wright (teclados e vocal) sempre procurou, intencionalmente ou não, condensar o maior número possível de significados em suas canções. Mais do que isso, a famosa banda de rock progressivo sempre foi bastante aberta para todo tipo de interpretação do público sobre suas musicas e álbuns.
No começo de tudo, a pulsão vibrante de Barrett, beirando à loucura, dava energia para inúmeros acordes, melodias, letras. Seus companheiros eram fabulosos intérpretes e incentivadores da vitalidade do carismático amigo Syd. Em The Dark Side of the Moon, já sem ele, que seguiu caminhos próprios, mergulhado na experiência lisérgica das décadas de 1960 e 1970, Waters e Gilmour conduziram a banda a uma intensa (e misteriosa) trajetória sobre as dores e delícias humanas. O famoso álbum de 1973 distribuiu diferentes prismas sobre temas como Tempo, Dinheiro, Sociedade. Do lado de cá, o público deu todo tipo de sentido às músicas. O mais notório é a suposta trilha musical secreta do filme “O Mágico de Oz”. Em The Wall, 1979, obra biográfica de Roger Waters, uma ópera-rock extremamente atual, sobre nossas mais profundas angústias individuais: amor, prazer, família, fama, solidão, guerra e paz.
Pink Floyd sempre foi assim. Intenso, provocador, enigmático. Talvez por isso mesmo a banda tenha sofrido tanto com conflitos internos. Além da perda de Syd Barrett para as drogas, o multi-instrumentista Wright foi tirado do grupo em 1979, por decisão unilateral de Waters. Ele seguiu como músico contratado. Em 1985, desentendimentos entre Waters e Gilmour provocaram a saída do baixista. A briga chegou aos tribunais ingleses, onde se decidiu pela manutenção do nome Pink Floyd sob as tutelas de Gilmour, Mason e Wright, que retornou como membro oficial. Waters desprezou a decisão dizendo que o Pink Floyd havia simplesmente acabado (deixando nas entrelinhas que ele era o Pink Floyd). O último álbum do quarteto, já vivendo debaixo do conflito de egos entre os líderes, foi The Final Cut (para bom entendedor, meia palavra basta), inteiramente idealizado por Waters.
Sem Waters, a banda gravou apenas dois discos em estúdio. O primeiro, A Momentary Lapse of Reason (me..pa..ba..!), ainda sob impasse jurídico, comandado inteiramente por Gilmour.
O segundo e, na verdade, o último álbum da banda, The Division Bell, faz 20 anos hoje!




O disco carrega em seu DNA a principal característica do Pink Floyd: nunca é apenas uma música ou um álbum. O conceito é o diálogo, a comunicação. Ou a falta deles. A despeito da música Great Day for Freedom, Gilmour não disse ter feito letras direcionadas ao seu antigo algoz, Waters, mas admitiu que essa é uma possibilidade. Nas camadas mais inconscientes, é possível que o álbum tenha sido gestado, justamente, na ausência do diálogo entre ambos. O próprio nome foi extraído da tradição do Parlamento Inglês de tocar um sino específico a cada vez que houvesse um impasse, uma divisão de opiniões, sobre questões importantes a serem votadas. Nada mais apropriado!
A capa e todo o encarte foram produzidos por Storm Thorgerson, artista que confeccionou praticamente todas as capas dos álbuns da banda.
Division Bell não foi bem recebido pela crítica. Tom Graves escreveu na Rolling Stone que o álbum é um “desconfortável sopro de sensibilidades grisalhas de meia-idade”. Também diz que se trata de um Pink Floyd “mais calmo, atmosférico e contemplativo”. Tom Sinclair, da Entertainment Weekly, foi ainda mais enfático: “Avareza é a única explicação concebível para este álbum. É difícil imaginar os mais dedicados fãs do Pink Floyd ouvindo um vago eco da grandeza de seus heróis nessa massa de ar quente”.
Porém, se o Pink Floyd nos ensinou algo, é saber olhar para o Tempo de maneira mais sábia. Tom Graves não escreveu errado no conteúdo, mas na forma. A “sensibilidade grisalha de meia-idade”, bem como o tom “calmo e contemplativo”, podem ser vistos como qualidades, não defeitos, neste derradeiro disco de uma das maiores bandas do rock. O ocaso do Pink Floyd foi a ótima turnê P.U.L.S.E., logo depois de Division Bell, e que rendeu um disco ao vivo muito bem-sucedido.
Em julho de 2005, após vinte anos, Waters, Gilmour, Mason e Wright deixaram os conflitos de lado e subiram no palco pela última uma vez, para o show do Live 8.
Mas essa história fica para outro dia… Porque todo dia é histórico.
*Felipe é fã de Pink Floyd desde a adolescência. Viu Pink Floyd ao vivo três vezes, embora nunca tenha visto o Pink Floyd ao vivo.
Ouça The Division Bell:
Fontes:
Um comentário sobre “Pink Floyd lança o último álbum”