POR PATRÍCIA MOLL*
Em um cômico plano de suicídio motivado por um diagnóstico de diabetes, Vinicius de Moraes declarou ao amigo Toquinho que gostaria de morrer em uma banheira cheia de água morna, munido de um vasto estoque de papos de anjo, que seriam comidos um a um, de papo para o ar, em puro êxtase de gemas de açúcar.
Já em “Feijoada à minha moda”, Vinícius descreveu o passo a passo do preparo do prato-símbolo do Brasil: “Melhor que nunca, este poeta, segundo manda a boa ética, envia-lhe a receita (poética), de sua feijoada completa. (…) Em atenção ao adiantado, da hora em que abrimos o olho, o feijão deve, já catado, nos esperar, feliz, de molho.(…) Os elementos componentes, de um saboroso refogado, tais: cebolas, tomates, dentes, de alho – e o que mais for azado”. E por aí vai…
Ao seu outro parceiro, Tom Jobim, Vinicius escreveu, na véspera de uma viagem de navio da França ao Brasil, que queria ser recebido com “uma galinha ao molho pardo com um arroz bem soltinho e papos de anjo, mas daqueles que só a mãe da gente sabe fazer”.
São várias as passagens (ou seriam pérolas?) na obra do mestre Vinicius de Moraes que falam sobre a sua paixão pela cozinha, virtude pouco conhecida diante de sua famosa predileção pelas bebidas, em especial o uísque.
Mas ao ler o recém-lançado livro Pois Sou um Bom Cozinheiro, de Daniela Narciso e Edith Gonçalves, editado pela Cia. das Letras, fiquei sensivelmente encantada ao descobrir o outro lado de Vinicius! O poeta adorava comer bem, cozinhar e servir os amigos, além de bater papo no lugar que considerava mais aconchegante da casa, a cozinha!
Fascinado por diminutivos, toda receita virava poema em suas mãos. Assim, não faltavam franguinhos, molhinhos, ovinhos e lombinhos bem tostadinhos.
“Galinha ensopada com batata e essas coisas”, “A fantástica carne assada da vovó Neném”, “Salpicão de mil cores” ou “Estrogonofe triste” são alguns exemplos de receitas que ele batizou. São mais de 100 pratos, alguns de família, outros que criou e também os clássicos que gostava de comer no Rio e em suas viagens pelo mundo. O livro traz ainda histórias e curiosidades da vida do poeta. Uma deliciosa leitura!
RECEITA: Chapéus de jóquei
Esta receita é uma invenção genuína do garoto Vina. Depois de apanhar ovos fresquinhos no galinheiro do quintal, ele cede a clara aos irmãos Helius e Laetitia, mistura a gema com açúcar e produz docinhos que serão cobertos por uma calda de caramelo especialmente preparada pela avó ou pela cozinheira da casa. Dono de incrível destreza manual — e de muita criatividade para batizar doces —, Vinicius despeja com cuidado o fio dourado de calda sobre as bolinhas amarelas e, como toque final, dá uma puxadinha na calda, de modo a desenhar a pala do chapéu de jóquei.
Ingredientes:
7 gemas
5 colheres (sopa) de açúcar
½ colher (sopa) de farinha de trigo
½ colher (sopa) de manteiga
¼ de colher (sopa) de essência de baunilha
20 unidades / 1 hora
Preparo:
Passe as gemas por uma peneira fina. Coloque-as em uma panela e misture o restante dos ingredientes, exceto a baunilha. Leve ao fogo médio, mexendo sem parar — se em determinado momento empelotar, continue mexendo até obter uma massa firme, que se solte da panela. Retire do fogo, acrescente a baunilha e misture até incorporá-la. Coloque a massa em uma travessa levemente untada com manteiga e deixe-a esfriar. Depois de fria, pegue quantidades pequenas com uma colher (café) e enrole-as, formando bolinhas do tamanho das de gude. Com muita destreza e cuidado, cubra as bolinhas com calda de caramelo quente (veja p. 43) e puxe a pala do “chapéu” com o cabo de uma colher de chá. Deixe esfriar.
* Patrícia Moll, 30 anos, é jornalista e proprietária da Coentro Comunica, assessoria de imprensa especializada em gastronomia.
Fontes:
– Livro Pois Sou um Bom Cozinheiro, de Daniela Narciso e Edith Gonçalves
Obrigado!!!!
Fernando, hoje suas 2 efemérides estão diferentes e deliciosas!
Vovó Dedé