A entrevista de Julinho da Adelaide

Há 40 anos… dia 7 de setembro de 1974.

“Jamais poderia passar pela minha cabeça que essa entrevista do Julinho, uma brincadeira que a gente fez, que 40 anos depois ia ter um cara me entrevistando!”.

Pois é, caro Mario Prata, a brincadeira com o amigo Chico Buarque acabou virando um episódio marcante na história da música e também da imprensa brasileira.

E o éfemello foi atrás de você pra saber como foi essa “ação entre amigos”! Porque há exatos 40 anos, nos dias 7 e 8 de setembro de 1974, o jornal Última Hora publicou “O samba duplex e pragmático de Julinho da Adelaide”.

Aos mais novos, aos que desconhecem ou aos que esqueceram: Julinho da Adelaide foi um jeito que Chico Buarque encontrou pra burlar a censura dos Anos de Chumbo da ditadura militar no Brasil. Chico criou o personagem fictício, que passou a ser o autor de suas músicas. No meio artístico, quase todo mundo sabia que Julinho era, na realidade, o próprio Chico. Só a censura não sabia!

Naquele 1974, Julinho já era famoso por Acorda Amor (“Chame o ladrão, chame o ladrão!”). Depois, ainda “compôs” Milagre Brasileiro e Jorge Maravilha.

Mario Prata, amigo de longa data de Chico, na época repórter do Última Hora e autor de teatro, propôs ao compositor fazer uma entrevista com o tal Julinho. Chico topou. O repórter foi consultar o diretor do jornal, Samuel Wainer. “O Samuel era mais louco que nós dois juntos! Achou engraçadíssimo e falou pra fazer”.

O papo foi marcado para a famosa casa da Rua Buri, em São Paulo, onde Mario se sentia em casa. Conhecia muito bem a família Buarque de Hollanda. O que era pra ser uma conversa, acabou virando um happening.

“Foi uma noite maluca, tinha bastante gente lá e, a partir de certo momento, todo mundo já bêbado, foi uma zona! Virou uma entrevista coletiva. Tem três vozes que se destacam mais no áudio: a minha, a do Melchíades Cunha Júnior, do Jornal da Tarde, e a do Homerinho, que na época era cunhado do Chico, casado com a Cristina”, lembra Mario.

Aliás, texto e áudio da entrevista foram resgatados em um almanaque escrito por Mario para o Pinheiro Neto, por ocasião dos 70 anos do escritório de advocacia, em 2012. Somente clientes, colaboradores e parceiros receberam o livro e o CD com a entrevista.

Voltando ao grande evento na casa dos Buarque de Hollanda, Mario lembra de passagem sobre a foto da mãe de Julinho, Adelaide, que acabou ilustrando a matéria.

“O professor Sérgio Buarque de Hollanda ficava em volta da mesa, com seu whisky, rindo muito com tudo aquilo. A hora que começou a falar da Adelaide, ele começou a mexer nos livros da biblioteca. Aí chegou do meu lado e abriu o livro. Tinha uma mulher negra, de um país da África, muito bonita. Ele apontou e falou: ‘Adelaide’ (sussurrando). Ele entrou no jogo igual ao filho”, recorda. A imagem da mulher saiu na matéria com crédito “Arquivo SBH”, as iniciais do historiador!

Hoje, quarenta anos depois, a brincadeira da entrevista rende papo e volta a ser motivo de riso entre Mario e Chico.

“Outro dia fui pra Natal, no Rio Grande do Norte. Tem um bar com um monte de foto dos artistas dos anos 1960 e 1970. Contei pro Chico e ele disse que conhecia. Aí ele falou: ‘Inclusive, me falaram que o Leonel tá morando lá em Natal!’. Entrei na dele, né? Falei: ‘Pois é, te liguei justamente pra falar isso. O Leonel tem um caminhão e ele carrega areia…’. A gente começou a viver, a criar o personagem lá em Natal agora! A brincadeira rende até hoje entre nós”.

O Leonel a que se refere Mario vem a ser o irmão de Julinho, que surgiu no meio da entrevista e acabou se tornando personagem importante da história fictícia do compositor. Foi, também, uma homenagem de Chico ao Leonel real, o irmão de Mario.

“Então foi assim, uma puta brincadeira! E agora tá você aqui me entrevistando… Vou mandar um email pro Chico, contando isso! Ele vai morrer de rir”, completa Mario, em mais uma gargalhada.

Pois é, Mario. Uma puta brincadeira de 40 anos atrás.

Fica a singela homenagem a você, ao Chico, à família Buarque de Hollanda, ao Samuel e, claro, ao eterno Julinho da Adelaide!

Acorda Amor:

Jorge Maravilha:

Milagre Brasileiro, com Miúcha:

Fontes:

chicobuarque.com.br

cultura.estadao.com.br

+ MAIS: leia AQUI a entrevista de Julinho da Adelaide!

3 comentários sobre “A entrevista de Julinho da Adelaide

  1. Saudades do Julinho, por isso saí em buscas de notícias de Julinho.
    Em 1974 eu tinha 13 anos e era obrigada a acreditar em muitas coisas que descobri que eram mentiras somente a partir de 1977, e depois de 1981 quando entrei na PUC-SP, no curso de administração de empresas. Ali a “última ficha” caiu. Chico Buarque entrou pra sempre em minha vida. Infelizmente hoje as mentiras, que no Brasil faziam suas rondas de forma marginal, se libertaram com força total e estão aí, protagonistas do cenário atual.

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